TJBA 19/01/2022 -Pág. 424 -CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL -Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.021 - Disponibilização: quarta-feira, 19 de janeiro de 2022
Cad 4/ Página 424
Os policiais LEANDRO SILVA COIMBRA e SAULO DE OLIVEIRA SANTOS E JOSÉ afirmaram, em depoimento, que receberam
chamado sobre os roubos realizados, momento que empreenderam busca pelos suspeitos, vindo a localizar dois indivíduos em uma
motocicleta, momento o qual, quando determinada a parada, estes empreenderam fuga, acelerando a motocicleta vindo, posteriormente a cair. Ressaltam que a guarnição viu o momento em que os dois acusados dispensaram os celulares, que foram apreendidos.
Ademais, cumpre destacar que o depoimento prestado em juízo, corrobora o prestado em sede policial e que os ambos os policiais
reconheceram os acusados.
Os réus, por sua vez, confessam, judicialmente, que praticaram os atos contra as referidas vítimas, afirmando tratar-se de uma brincadeira. RAFAEL informa que pilotava a motocicleta enquanto o outro acusado abordava as vítimas, fato confirmado por CLEIDSON.
Certo que é, o processo penal não se pretende a estabelecer um juízo de certeza inconteste sobre os fatos analisados, bastando que
estejam presentes elementos concretos, diante das possibilidades factíveis, que afastem dúvida razoável sobre os acontecimentos e
a respeito da infração da lei penal.
Com efeito, o acervo probatório produzido em juízo, consistente nos depoimentos das vítimas, testemunhas e confissão dos acusados, demostram, de maneira clara e inconteste, a existência do crime de roubo consumado. Ademais, os celulares foram devidamente
apreendidos pela guarnição.
Os depoimentos prestados durante a instrução processual são harmônicos entre si, sendo relevante destacar que não há contradições
sobre qualquer ponto essencial, e, por isso, provam, de forma suficiente, a autoria e materialidade do quanto imputado.
A alegação de ausência de grave ameaça não merece prosperar, isso porque a elementar da grave ameaça se concretiza enquanto
promessa de mal grave e iminente, um prenúncio de um fato desagradável, com força intimidativa, desde que seja sério o bastante
para causar um temor na vítima.
Consoante orientação do STJ, os atos praticados pelos réus caracterizam a grave ameaça, essencial ao crime de roubo, uma vez que
“pode ser empregada de forma velada, pelo temor causado à vítima, o que leva a permitir que o agente promova a subtração sem
que nada possa a pessoa lesada fazer para impedi-lo” (HC 105.066/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em
16/09/2008, DJe 03/11/2008).
Certo, portanto, que a forma de abordagem dos acusados, um pilotando a motocicleta e o outros utilizadas palavras intimidadoras
“dizendo para passar o celular e não olhar para trás”, “passa o celular! Passa tudo senão Vc morre!”, foram, capazes, de maneira
indubitável, a causar temor de mal futuro às vítimas.
Em relação ao pleito de desconsideração do depoimento das testemunhas policiais, a jurisprudência entende que tais declarações
possuem valor probatório e são meio de prova idôneo para embasar a condenação, com a observância do contraditório, mormente
quando em consonância com as demais provas dos autos não se aponta qualquer motivo que coloque em dúvida a veracidade dos
relatos dos agentes públicos.
Nesse sentido:
PENAL. PROCESSO PENAL. FURTO QUALIFICADO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PALAVRA DE VÍTIMA. RECONHECIMENTO. DEPOIMENTO POLICIAL.VALOR PROBATÓRIO. SENTENÇA MANTIDA.
1. A palavra da vítima assume especial relevo como elemento de prova, merecendo credibilidade e podendo sustentar a condenação,
máxime quando foi realizado o devido reconhecimento pessoal e não for demonstrada qualquer razão para incriminação gratuita do
réu. 2. O depoimento do policial responsável pelo flagrante tem valor probatório e pode fundamentar o decreto condenatório, mormente
quando produzidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, não ficando demonstrada qualquer razão ou motivo para querer
incriminar gratuitamente os réus. (...) (Acórdão n.1065227, 20170110000513APR, Relator: JESUINO RISSATO, Revisor: WALDIR
LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, 3º TURMA CRIMINAL, Data de Julgamento: 30/11/2017, Publicado no DJE: 18/12/2017. Pág.: 260/262
Em reposta a acusação, sustentam os réus a atipicidade material da conduta, caracterizadora do Princípio da Insignificância ou Bagatela. Nos termos do quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos do HC 84.412-0/SP, para caracterização do delito
bagatelar, faz-se necessário observar se estão presentes os seguintes requisitos cumulativos: a) mínima ofensividade da conduta; b)
nenhuma periculosidade social; c) reduzido grau de reprovabilidade; d) inexpressividade da lesão jurídica.
In casu, o STJ já se manifestou que não se aplica o princípio da bagatela ao crime de roubo, ainda que ínfimo o valor do bem, em razão
da violência e/ou grave ameaça que são elementares ao tipo. A natureza complexa do tipo penal, que tutela não apenas o patrimônio
individual, mas a integridade física e moral da vítima, impossibilita considerar como de menor relevância a conduta do agente, afastando, por conseguinte, a incidência da referida causa excludente supralegal de tipicidade.
Portanto, diante do lastro probatório colhido nos autos, resta inconteste os delitos imputados aos acusados.
A conduta é antinormativa, inexistindo permissivo legal no ordenamento jurídico, a autorizar, relevar ou atenuar a ação perpetrada pelo
agente. Não estão presentes quaisquer excludentes da culpabilidade do agente, sendo a condenação medida que se impõe.
Igualmente, resta comprovado o concurso de agentes, sendo que, conforme confissão dos réus, estes realizaram a separação e organização das ações, um abordando as vítimas enquanto o outro pilotava a motocicleta. Assim, rejeito a tese defensiva no sentido que o
crime se deu na sua forma simples.
Por derradeiro, no que diz respeito ao concurso de crimes, deve-se observar que, mediante duas ações os acusados atingiram o
patrimônio de duas vítimas em condições similares de execução, em curto lapso temporal e em vias próximas, razão pela qual caracterizada a continuidade delitiva.
DISPOSITIVO
ANTE O EXPOSTO, julgo PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado, para condenar CLEIDSON RODRIGUES DE AMORIM e
RAFAEL LEMOS ROCHA como incurso nas penas do artigo 157, § 2º, inciso II, na forma do art. 71, todos do Código Penal.
Passo à dosimetria, aplicando o modelo trifásico, conforme determina o artigo 68 do Código Penal.
CLEIDSON RODRIGUES DE AMORIM
Primeira fase
1) Culpabilidade não ultrapassou aquela inerente ao tipo penal;
2) Antecedentes: ausente condenações anteriores;
3) Conduta Social: não constam nos autos nenhuma informação que desabone a conduta do mesmo;
4) Personalidade: não existem nos autos elementos suficientes à aferição da personalidade do agente, razão pela qual deixo de valorá-la;
5) Motivos do crime: o motivo do crime se constitui pelo desejo de lucro fácil é inerente à própria tipicidade;