TJBA 15/06/2022 -Pág. 1608 -CADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL -Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.119 - Disponibilização: quarta-feira, 15 de junho de 2022
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Diz ainda ser impossível que o ônibus transite com a porta aberta, pois todos os seus veículos possuem um dispositivo denominado “Anjo da Guarda”, o qual impede que o ônibus se desloque com a porta aberta.
Argumenta que não contribuiu de qualquer forma para a ocorrência do evento, não praticou qualquer ilícito e inexiste dever de
indenizar.
Refuta os pedidos.
Réplica conforme ID 88952774.
Proferida decisão de saneamento e organização na qual restou declarada a tempestividade da defesa, indeferida a prova pericial
e deferida a prova oral (ID 180492431).
Na audiência de instrução foi produzida a prova oral (ID 198267434).
No prazo estabelecido para tanto tão somente o Réu apresentou alegações finais (IDs 203301870).
Retornaram os autos conclusos para sentença.
Relatados, decido.
O feito se encontra apto para julgamento.
Cuidam os autos de ação indenizatória decorrente de fato do serviço, na forma do art. 14 do CDC.
Trata-se de responsabilidade objetiva, na forma do art. 12 do CDC, apenas afastada diante da prova da inexistência do defeito
ou da culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme art. 14, § 2º do referido diploma legal.
Resta patente dos autos que, enquanto era transportada pela Ré, a Autora foi vítima de acidente com queda quando várias pessoas fugiram de roubo praticado por terceiros.
Considerando que a queda da Autora deveu-se ao deslocamento em massa de passageiros em pânico e em fuga coletiva, há
que se reconhecer que tal evento trata-se de desdobramento do assalto ocorrido.
O boletim de ocorrência de ID 89117458 comprova que a Autora estava sendo transportada pela Ré quando ocorreu o assalto e
o sinistro causador da fratura em membro inferior. Entendo que o registro da ocorrência policial e o exame no IML (ID 521117711)
provam a ocorrência do crime dentro de ônibus integrante da frota da Acionada, que a Autora estava nesse veículo e a lesão
decorrente do delito.
Não obstante tratar-se a responsabilidade objetiva, afasta-se a responsabilidade da empresa de transporte se o dano decorrer
de fatos estranhos ao objeto do contrato entabulado, consoante o artigo 734 do Código Civil. Assim, a presunção de culpa pode
ser afastada pela prova de ocorrência de fato de terceiro.
No caso em comento, o roubo mediante emprego de arma de fogo consiste em fato estranho ao objeto do contrato de transporte
e não deriva de ato omissivo ou comissivo da Ré, porquanto excede suas obrigações de cuidado decorrentes da atividade.
Neste diapasão, constitui causa excludente da responsabilidade da empresa transportadora o fato inteiramente estranho ao
transporte em si, como o evento roubo ocorrido no interior do ônibus.
Na presente lide, constata-se que as consequências sofridas pela Autora decorrem de caso fortuito, dada a impossibilidade de
resistência do Réu, diante especialmente da ameaça e violência empregadas através de arma de fogo.
Registre-se que o risco em questão, de nenhum modo é inerente à atividade exercida pelo Réu e este em nada contribuiu para
o resultado danoso.
A respeito da matéria, bem explana Orlando Gomes:
“Admitida a sinonímia, caso fortuito, ou força maior, é todo fato necessário, a cujos efeitos não é possível resistir. Para sua caracterização, dois requisitos se exigem: a) objetivo; b) subjetivo. O requisito objetivo configura-se na inevitabilidade do acontecimento. Contudo, não basta, porque a pessoa que lhe sofre os efeitos pode ter concorrido para a eles se expor, ou para os agravar.
É preciso, por isso, que ao requisito objetivo da inevitabilidade se venha juntar o elemento subjetivo, que é a ausência de culpa,
entendido, como intuitivo, que ela não se refere à produção do acontecimento.” (GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil.
10. ed. São Paulo: Forense, 1988, p. 258).
Destarte, não há como se falar em defeito do serviço, restando patente a excludente de responsabilidade prevista no art. 14.
O Superior Tribunal de Justiça vem manifestando o seguinte entendimento: