TJSP 06/07/2020 -Pág. 100 -Caderno 3 - Judicial - 1ª Instância - Capital -Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: segunda-feira, 6 de julho de 2020
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano XIII - Edição 3077
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valendo a presente como mandado ou precatória. Intime-se. - ADV: MICHEL DAVID MORENO (OAB 315975/SP)
Processo 1055534-42.2019.8.26.0002 - Procedimento Comum Cível - Cessão de Crédito - Souen e Nahas Construtora e
Incorporadora Ltda. - Vera Lucia Prado Mattos - Vistos. SOUEN NAHAS CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA. move a
presente AÇÃO DE COBRANÇA contra VERA LÚCIA PRADO MATTOS, alegando, em síntese, que foi responsável pela execução
do empreendimento Studio Oliveira Dias, sob a modalidade de regime de construção por administração (“preço de custo”), em
que as decisões são tomadas pelos compradores/investidores, os quais realizam aportes previamente ajustados e aprovados
em assembleia para a execução da obra, ou seja, os compradores/investidores são responsáveis por arcar com o totalidade das
despesas, na proporção das frações ideais do terreno correspondente às respectivas unidades autônomas. Sendo assim, a
evolução e o cronograma da obra dependeram das decisões tomadas pelos compradores/investidores em assembleia, assim
como dependeu da regularidade dos aportes previamente ajustados a aprovados em assembleia. A dívida ora em cobrança
refere-se aos aportes aprovados, e não pagos pela ré, para custear a construção e pagamento de taxa de administração das
unidades 63C e 64B e para custear as despesas de legalização da documentação e decoração das unidades e áreas comuns do
empreendimento das unidades 62, 65 e 66, em que pese a confissão do inadimplemento e as tentativas frustradas de composição.
A ré ingressou com ação de procedimento comum (autos n° 1104888-67.2018.8.26.0100, em trâmite perante a E. 16ª Vara Cível
Central) visando não pagar o saldo devedor, receber as chaves das unidades 63C, 64B, 62, 65 e 66, bem como receber
indenização pelos danos materiais e morais sofridos. Os pedidos foram julgados improcedentes, restando pendente de
julgamento recurso de apelação. Por tais motivos, pede a procedência da ação para o fim de ser a ré condenada ao pagamento
de R$ 914.678,03, em valores de agosto/2019, devidamente atualizado até a data do efetivo pagamento. Acompanharam a
inicial os documentos de fls. 11/472. O MM. Juízo da 3ª Vara Cível do Foro Regional de Santo Amaro declinou da competência
e determinou a redistribuição dos autos (fl. 473). Regularmente citada, a ré apresentou contestação arguindo, preliminarmente,
aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, com a necessidade de inversão do ônus da prova, e requerendo a concessão
dos benefícios da justiça gratuita. No mérito, alegou, em síntese, que não figura como mera compradora das 5 unidades até hoje
não entregues, pois as recebeu como parte do pagamento pela venda do terreno onde foi edificado o empreendimento, sendo
que 3 unidades foram negociadas para entrega “pronta e acabada”, não se submetendo a qualquer custeio, e 2 unidades pelo
regime de administração; pelo contrato de construção pelo regime de administração, a obra que findaria em novembro/2016, foi
finalizada e entregue tão somente em meados de março/2019, o que lhe causou enorme desequilíbrio financeiro, pois, suportou
as cobranças por 10 meses além do previsto, sem receber os frutos da exploração das unidades, principal motivo de ter
concordado em receber os valores da venda de seu terreno em unidades residenciais; suspendeu os pagamentos da taxa de
administração a partir de 20/09/2017, quando o encargo se tornou excessivamente oneroso; a sua mora decorre da conduta da
autora, que descumpriu o contrato de venda e compra, não entregando as unidades 62, 65 e 66, o que justifica a exceção do
contrato não cumprido; houve claro equívoco na sentença proferida nos autos da ação ordinária n° 1104888-67.2018.8.26.0100
que apontou que todas as unidades foram contratadas sob o regime de construção por administração, o que é objeto de recurso;
as unidades 62, 65 e 66 já deveriam ter sido entregues prontas e acabadas não havendo justificativa para retenção das chaves;
tentou, sem sucesso, resolver as pendências com a autora; não há qualquer interdependência entre o contrato de construção
pelo regime de administração com o cumprimento do aditamento ao compromisso de venda e compra; a recusa na entrega das
chaves das unidades 62, 65 e 66, que representam o pagamento de R$ 2.225.000,00, por força do compromisso de venda e
compra, autoriza a suspender os pagamentos das unidades 63C e 64B; a autora se recusa a receber os valores decorrentes da
legalização da documentação e decoração das áreas comuns para entrega das chaves das unidades 62, 65 e 66; os documentos
apresentados pela autora não apontam com segurança os supostos valores devidos pela ré; deve haver compensação entre os
valores que receberia a título de exploração das unidades (lucros cessantes) e os valores objeto da cobrança (fls. 534/562).
Juntou os documentos de fls. 563/617. Houve réplica (fls. 623/661), com pedido para reconhecimento de litispendência,
impugnação ao pedido de justiça gratuita e com a juntada de documentos (fls. 662/717). A ré manejou petição e documentos
para reiterar e ratificar o pedido de concessão do benefício da justiça gratuita (fls. 718/731). Houve tréplica (fls. 735/757). É O
RELATÓRIO. DECIDO. A hipótese é de julgamento antecipado da lide, uma vez que a questão controvertida é unicamente de
direito, já estando suficientemente comprovada a matéria fática. Isso porque, por força do princípio constitucional que impõe a
razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII), é dever do Juiz (CPC, art. 139, II) proceder à pronta análise da pretensão,
determinando a realização das provas que sejam apenas efetivamente necessárias para o julgamento (CPC, art. 370). Com
efeito, a análise dos fundamentos e documentos trazidos por ambas as partes basta para a compreensão da controvérsia e
decisão da demanda. Indefiro o pedido de justiça gratuita feito pela ré. Com efeito, a disciplina do atual Código de Processo
Civil, apesar de ter revogado alguns dispositivos da Lei nº 1.060/50, dentre eles, o art. 4º, parágrafo 1º, manteve, em sua
essência o regramento da referida Lei, presumindo como verdadeira a alegação de insuficiência (fl. 563) deduzida exclusivamente
pela pessoa física (CPC, art. 99, § 3º). Entretanto, referida norma deve ser analisada em conjunto com o artigo 5º, inciso LXXIV,
da Constituição Federal, que estabelece que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos”, o que significa que a declaração de pobreza gera mera presunção relativa da necessidade do
benefício, cabendo ao juiz, em cada caso concreto, avaliar o efetivo cabimento da benesse legal, o que não impede, portanto,
uma análise apurada sobre a real condição econômica do autor, a fim de se evitar abusos e prestigiar os verdadeiramente
necessitados. Na hipótese, a declaração de imposto de renda relativa ao ano calendário 2018 indica que a ré aufere rendimentos
tributáveis anuais, oriundos de locatícios, na ordem de R$ 26.400,00, todavia, apresenta patrimônio de R$ 2.697.530,53, com
vários imóveis, objetos de arte e joias (fls. 722/731). Nessas condições, manter o benefício, que em última análise, é custeado
pelo Estado, equivaleria a carrear à população o ônus que deveria ser suportado pela ré, o que não se mostra admissível. Não
há que se falar em aplicação da legislação consumerista. Isso porque as partes entabularam dois negócios jurídicos: o de venda
e compra de terreno para incorporação imobiliária, sendo entrega de unidades como pagamento do preço, e o de construção do
empreendimento pelo regime de administração (também chamado “a preço de custo”), nos termos dos artigos 58 e seguintes da
Lei n° 4.591/64. Neste particular, a jurisprudência consolidou entendimento no sentido de não reconhecer relação consumerista
nas contratações entabuladas sob a regência dos referidos dispositivos legais: “1. No contrato de construção sob o regime de
administração ou preço de custo, não há relação de consumo a ser tutelada pelo Código de Defesa do Consumidor, devendo a
relação jurídica ser regida pela Lei de Condomínio e Incorporações Imobiliárias - Lei 4.591/64. Precedentes. Súmula 83/STJ.”
(STJ, AgInt no Resp 1.042.687/PR, Quarta Turma, rel. Min. RAUL ARAÚJO, j. 27/09/2016). Não há que se falar em litispendência
(CPC, art. 337, §3°), pois não se está aqui repetindo a ação declaratória que está em curso perante a 16ª Vara Cível deste Foro
Central (autos n° 1104888-67.2018.8.26.0100). Na realidade, a presente ação de cobrança deveria ter sido a reconvenção
daquela ação declaratória. Todavia, optou a autora por ingressar com a presente cobrança, sem o trânsito em julgado daquela
ação. Superadas essas premissas, a ação é procedente. As partes celebraram instrumento particular de compra e venda no
qual a ré vendeu à autora o imóvel, em que parte do pagamento seria realizado com a entrega de “studios” do empreendimento,
na seguinte forma: (i) parte do preço R$ 760.000,00 pago mediante frações ideais correspondentes às unidades 63C e 64B,
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