TJSP 20/10/2022 -Pág. 1093 -Caderno 3 - Judicial - 1ª Instância - Capital -Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quinta-feira, 20 de outubro de 2022
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano XVI - Edição 3615
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devidamente assistida e que em atendimento pela equipe de neurocirurgia houve o diagnóstico de pertuito esofágico. Esclareceu
que não existe procedimento sem risco e que “o ato iatrogênico não implica em erro médico e sim uma consequência de um ato
médico na assistência à Saúde”. Informou que após outros procedimentos a autora recebeu alta hospitalar estando em bom
estado geral. Alegou que em consultas seguintes a autora foi submetida a cervicotomia exploradora e tentativa endoscopia
digestiva, interrompida pela ocorrência de estenose esofageana. Aduziu que a autora apresentou quadro grave de instabilidade
emociona e que foi recomendado tratamento psiquiátrico para posteriormente retomar o tratamento de esofágico. Informou que
após setembro de 2018 a autora e sua família não mais procuraram o Dr.Ricardo para continuidade do tratamento e que, em
momento algum, houve recusa de atendimento pelo mesmo. Esclareceu que “a Autora não imputa qualquer falha ou irregularidade
no atendimento de natureza hospitalar”. Rechaça a existência de danos morais e estéticos e postula pela inexistência de pensão
mensal. Pleiteia pela concessão da justiça gratuita. Postula, por fim, pela improcedência da ação. Devidamente citado, o plano
de saúde UNIMED BELO HORIZONTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO apresentou sua contestação às fls. 4206/4352,
arguindo que atuou como mera operadora de planos de saúde. Esclareceu que não há vinculo de subordinação entre o hospital
e o médico com a operadora requerida. Explanou que a autora se submeteu a uma cirurgia eletiva ciente que os riscos
compensavam face ao risco de ficar tetraplégica se não fizesse. Informou que a escolha do hospital e do profissional foi de livre
escolha da autora, em uma ampla lista de credenciados. Evidenciou que houve uma complicação pós cirúrgica e que “Toda a
evolução posterior foi consequente a complicação apresentada que é descrita como uma complicação possível da via de acesso
anterior”. Destacou que “como operadora de plano de saúde da autora, ofertou programa de acompanhamento domiciliar após
alta hospitalar”. Arguiu pela inaplicabilidade da responsabilidade subjetiva disposta no Código de Defesa do Consumidor visto
que o plano de saúde somente poderia ser responsabilizado se verificada a existência dos elementos culposos nas condutas do
profissional médico, o que não ocorreu. Postulou pela inexistência de danos morais e estéticos. Arguiu pela inexistência dos
requisitos para o pagamento de pensão. Rechaçou os valores pleiteados a título de indenização e impugnou o pedido de
inversão do ônus da prova. Pleiteou pela improcedência da ação. Houve deferimento do sigilo dos documentos apresentados
em decisão de fl. 4353. A autora apresentou réplica às fls. 4369/4375. Houve indeferimento da justiça gratuita pleiteada pelo
hospital, à fl. 4381. Intimadas, as partes peticionaram informando as provas que pretendiam produzir (fls. 4386/4389, 4390/4392
e 4415/4416). Foi interposto recurso de agravo de instrumento, pelo hospital requerido, recebido sob o nº 22198012020198260000,
em petição de fls. 4393/4414. Em decisão saneadora, às fls. 4430/4432 foi afastado o pedido de denunciação à lide do médico
responsável pela cirurgia, rejeitada a exceção de incompetência e afastada a preliminar de ilegitimidade passiva do corréu
IPMMI- Hospital Madre Teresa, sendo deferida a produção de prova pericial e postergada a análise da pertinência da prova oral.
Houve a interposição de recurso de agravo contra a decisão saneadora (nº 2133048-26.2020.8.26.0000), sem êxito da parte
agravante na modificação do julgado (fls. 4512/4527). As partes apresentaram os quesitos às fls. 4438/4443, 4444/4445 e
4448/4456. O perito apresentou estimativa de honorários à fl. 4479. Houve manifestação quanto aos honorários às fls. 4485/4494,
4495/4496 e 4497/4498. A decisão de fl 4533 arbitrou os honorários periciais em R$ 20.000,00. Houve interposição de agravo de
instrumento pelo hospital requerido sob o nº 2069731-20.2021.8.26.0000 recebido com efeito suspensivo às fls. 4541/4556. O
venerando acórdão de fls. 4570/4578 deu provimento parcial ao recurso, estipulando os honorários periciais em R$ 15.000,00.
Houve juntada do prontuário da requerente, previamente solicitado, pelo ICHC às fls. 4601/7686. As partes apresentaram os
quesitos às fls. 7691/7693 e 7694/7695. A corré UNIMED BH não apresentou quesitos, mas apresentou assistente técnico em
petição de fl. 7701. O perito apresentou o laudo às fls. 7721/7790. As partes manifestaram-se quanto ao laudo em petições de
fls. 7795/7796, 7802/7803 e 7804/7815 solicitando esclarecimentos. Houve esclarecimentos ao laudo pericial apresentado às
fls. 7818/7822, com manifestação das partes às fls. 7827, 7828/7833 e 7834/7844. Intimadas, as partes manifestaram-se quanto
a oitiva de testemunhas às fls. 7855/7857, 7858/7860 e 7861/7865 e o rol de testemunhas às fls. 7872/7873, 7874 e 7875. É o
relatório do necessário. Decido. A prova oral pretendida é completamente desnecessária à solução da controvérsia fática
estabelecida, na medida em que esta foi resolvida pela prova técnica, inexistindo motivo para a inquirição de testemunhas
(profissionais da saúde que participaram das cirurgias) sobre fatos que só por exame pericial podem ser provados (artigo 443,
inciso II, do Código de Processo Civil). Por primeiro, necessário estabelecer que tanto o hospital como a operadora
deplanodesaúdepossuemresponsabilidadeobjetiva de indenizar consumidor por eventual dano decorrente deerromédico de
profissionalcredenciado e que desempenhava atividade no hospital, na medida em que se inserem na cadeia de fornecedores
do serviço prestado ao consumidor. Nesse sentido, manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça 3ª Turma REsp nº 908.359/SC,
Rel. Minª Nancy Andrighi, j. 27/8/2008, DJ 17/12/2008. Estabelecido isso, passo a análise da alegação de erro médico. O perito,
em laudo extremamente técnico, concluiu: “11.01. Pericianda com antecedente de doença degenerativa da coluna cervical desde
2006, já tendo sido submetida a tratamento cirúrgico por meio de acesso cervical anterior e artrodese no nível C5-C6 no ano de
2011, com resolução do quadro cervicobraquial. 11.02. Em 2017 passou a apresentar quadro de cervicobraquialgia direita cuja
investigação radiológica revelou a presença de hérnia discal extrusa C4-C5 a direita, protrusão discal C5-C6 e outras alterações
degenerativas. Devido à intratabilidade clínica foi corretamente indicado procedimento cirúrgico da coluna cervical, tendo sido
realizado em 19/07/2017 no Hospital Madre Tereza, ora réu. Não foram relatadas intercorrências intra-operatórias e a pericianda
evoluiu com dor e comprometimento da força no membro superior esquerdo, assim como com perfuração esofágica. A perfuração
esofágica deve ser enquadrada como intercorrências inerente ao procedimento, visto que passível de ocorrência, mesmo
durante cirurgias executadas sob rigor técnico e por profissionais habilitados e experientes. No caso em tela a pericianda já
havia sido operada anteriormente, o que implicava em maior dificuldade técnica para a dissecção cirúrgica exigida, dada a
reação cicatricial local, com fibrose e aderência entre estruturas, aumentando os riscos de lesão do esôfago. 11.02. Após a
cirurgia também evoluiu com dor e déficit neurológico em membro superior esquerdo, com comprometimento da função do
músculo bíceps. A avaliação radiológica realizada logo após a cirurgia mostrou mal posicionamento da placa e dos parafusos
que se encontravam muito lateralizados para o lado esquerdo. Diante do conhecido mal posicionamento da placa e dos
parafusos, promotores de dor e déficit neurológico em membro superior esquerdo, estava indicada a remoção imediata da placa
e dos parafusos, o que deveria ter sido realizado durante a tentativa de correção de lesão esofágica ocorrida em 20/07/2017.
11.03. Em 20/07/2017, frente à identificação da perfuração esofágica, foi indicada reabordagem cirúrgica de urgência, conduta
apropriada e oportuna. A cirurgia identificou e corrigiu a lesão esofágica, assim como efetuou a limpeza cirúrgica recomendada.
Contudo, não foi realizada a remoção da placa e dos parafusos, conduta que se impunha diante do quadro de dor e déficit
neurológico no membro superior esquerdo, bem como pelos riscos de recorrência e agravamento da lesão esofágica por
compressão promovida pela placa e pelos parafusos. 11.04. A pericianda evoluiu com resolução do quadro de infecção local
após internação e tratamento antibiótico prolongado, mas manteve a queixa de dor e o déficit neurológico em membro superior
esquerdo, além de recorrência da perfuração esofágica, impendido ingesta alimentar por boca, com necessidade de jejunostomia.
11.05. Em fevereiro de 2018 a pericianda foi reinternada no Hospital Madre Tereza para nova tentativa de tratamento da lesão
esofágica. Neste momento, mantinha-se a indicação de remoção da placa e dos parafusos diante do quadro neurológico do
membro superior esquerdo e das dificuldades encontradas com a cicatrização esofágica. Durante a cirurgia foi observada
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